terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Túmulo Negro...


   Em tempos houve uma criança feliz, mas a amargura de anos passados transformou-a lentamente num túmulo negro de desalento. Os pilares que a fortemente suportavam e mantinham hirta nos desafios e discórdias de um presente envelhecido, foram-se derrubando com o tempo e a fortaleza então destruindo. O poder que nela fluía e dela se libertava levantou forças, erguendo pedras e rochas ao longo de eras glaciares e épocas soalheiras. Assim remendaram-se as barreiras, apenas cessando o suor que se verteu no corpo, libertando um fio escuro de angústia incrustada.
   As estações de claridade e rubor, de sombra e negrume foram-se passando, mas a harmonia nunca foi recomposta. Roubaram-lhe de novo valores que em tempos de ingenuidade não compreendia. Agora, atormentam-lhe o inconsciente nas noites dormidas entre lençóis de esperança e a estabilidade e resistência das vigas de madeira. Arrancaram-lhe monstruosamente a inocência. Levaram fugazmente cada pedaço que dela restava, deixando-a desprotegida.
   No seu quarto, sozinha, ela silenciosamente suprime os impulsos de raiva pelo que a vida sem misericórdia e piedade lhe tirou. Sem ninguém para ver o tormento e aflição, explode no interior da caixa de vedações brancas por pintar, a que antes chamara de quarto - e agora seu único refúgio. No seu abrigo, ela melancolicamente alivia o aglomerado de dias vividos em desespero num mundo negro e cruel, num mundo de gente maldosa. Lá, liberta-se contra o destruidor de histórias de encantar que nem tempo para uma simples gata borralheira lhe fora oferecido.
   Sem saber porquê retiraram-lhe os sonhos e as esperanças, retiraram-lhe a luz e a bonança, o que mais lhe levarão? Quanto mais terão de lhe roubar para que algo de bom, algum contentamento se entranhe na vida empalidecida pelo tempo? Onde está o equilíbrio entre o preto e o branco, a morte e a vida, o amor e o ódio, o Yin e o Yang?
   Porquê acreditar no destino, ou confiar nele, se tudo de repente pode acabar com um olhar embaciado por lágrimas vertidas nas vestes dum futuro roubado.
   As investidas do inimigo deixaram-lhe marcas no físico adormecido. O inconsciente mostra os sinais das trevas que rapidamente lhe alcançaram a luz e a tornaram cega para com ela mesma. No céu já não restam estrelas brilhantes para lhe iluminar as noites passadas ao relento de pesadelos, deixaram-na descorada nas sombras.    

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